A História da Colônia Alemã em Santo Amaro
Redação e pesquisas: Julio Guilger Simões

A História da Colônia Alemã em Santo Amaro (São Paulo), tem seu início em "1826" (segunda década do século XIX).

No final do Primeiro Reinado, após o casamento de Dom Pedro I com Dona Amélia de Leuchtbenberg, passou a predominar no reino a preocupação com as guerras que aconteciam no sul do País e com a escassa e necessária mão de obra para a agricultura paulista.

Em razão disto, o Imperador contratou o Major Johann Anton von Schaeffer para buscar na Europa soldados para lutarem nas guerras do sul e colonos para trabalharem na agricultura paulista.

Como naquela época, muitos paises europeus, principalmente a Alemanha, estavam passando por uma grande recessão econômica, com promessas de honrarias, riquezas e terras próprias, foi fácil para Von Schaeffer aliciar pessoas nos Estados meridionais da Alemanha, que se enquadrassem naquelas necessidades.

E foi assim que, acreditando naquelas promessas, a partir de 13 de dezembro de 1827, "centenas de camponeses alemães" começaram a desembarcar no Brasil (primeiro no Porto da Cidade do Rio de Janeiro e depois no Porto de Santos - São Paulo), para serem distribuídos em colônias que seriam determinadas.

Para contarmos, então, a verdadeira epopéia à qual esses imigrantes alemães foram submetidos, tentando obedecer os princípios de narração (espaço / tempo / fato / personagens), iremos começar pela história do local para onde foram eles mandados após desembarcarem no Brasil. Vamos, então, a história deste local!

A vila de Santo Amaro

Da aldeia da Tribo Guaianases, do Cacique Caá-ubi, que existia à beira do Rio Jeribatiba (palmeira que produz cocos em abundância), na localidade por eles denominada Ibirapuera (mata grande), surgiu o que é, hoje, o Bairro de Santo Amaro.Em 1556, os missionários jesuítas, que realizavam trabalhos de catequese e educação de crianças índias e mamelucas, por determinação do Padre Manoel da Nóbrega, estavam distribuídos em três locais: Na Casa de São Vicente (primeira Vila do Brasil), que era a sede Provincial da Ordem; - Na Casa de São Paulo da Companhia de Jesus (São Paulo de Piratininga); e em Jeribatiba (Santo Amaro).

O jesuíta José de Anchieta, vindo da Casa de São Paulo, em uma das várias vezes que visitou a Aldeia de Jeribatiba, percebeu que, devido ao número de índios catequizados e colonos instalados na região, era possível constituir ali um povoado. Contando esta sua idéia aos moradores locais, foi ela prontamente aprovada por todos. No entanto, Anchieta os alertou de que, para concretizar esta sua idéia, se fazia necessário: primeiro, a construção de uma capela; e, segundo, a imagem de um santo a quem esta capela seria dedicada.

Ao tomarem conhecimento daquela proposta, João Paes e sua esposa Suzana Rodrigues, que moravam próximo ao local e possuíam uma pequena imagem de Santo Amaro (padroeiro dos agricultores e discípulo de São Bento), doaram-na à comunidade.

Foi assim que os moradores locais, após construírem uma pequena capela de "taipa de pilão e não forrada", colocaram nela a pequena imagem de Santo Amaro.

Até hoje, aquela pequena imagem, que a seguir é reproduzida, pode ser vista na Igreja Matriz de Santo Amaro onde se encontra perfeitamente conservada.

A pequena imagem de Santo Amaro

A partir daí, ao longo dos anos, esta região veio sendo conhecida por diversos nomes indígenas como: Birapuera; Virapuera; Ibirapuera; Geribatiba; Geribativa; Jeribatiba; Santo Amaro de Virapuera; Santo Amaro de Ibirapuera, até que tomasse definitivamente o nome de: "Santo Amaro".

A freguesia de Santo Amaro

Em 1686, com o progresso advindo graças à chegada dos imigrantes alemães (adiante relatada), o Bispo do Rio de Janeiro, Dom José E. Barros Alarcão, confirma a capela curada em Ibirapuera e eleva aquele povoado a categoria de Freguesia, com o nome definitivo de Santo Amaro (o primeiro vigário que Santo Amaro teve foi o Padre João Pontes).

O município de Santo Amaro

Em 1832, Santo Amaro torna-se município, separando-se de São Paulo, e foi instalado em 7 de abril de 1833 com a eleição de 7 (sete) vereadores.

Em 6 de maio de 1833, sob a presidência de Francisco Antônio das Chagas (pai de Paulo Eiró), realizou-se a primeira seção da Câmara Municipal de Santo Amaro.

O novo município abrangia todo o território que se situava ao sul do Córrego da Traição e estendia-se até a Serra do Mar (hoje aquele córrego é canalizado e sobre ele existe a Avenida dos Bandeirantes). Na sua formação estavam incluídas em seu território as áreas que hoje correspondem aos municípios de Itapecerica da Serra, Embu, Embu-Guassu, Taboão da Serra, São Lourenço da Serra e Juquitiba que, em 1877, se separaram de Santo Amaro para a formação do município de Itaperecida da Serra.
Em 11 de maio de 1877, pela Lei Provincial número 56, foi autorizada a construção de uma linha férrea, que deveria fazer a ligação entre São Paulo e o povoado de São Lourenço (atual município de São Lourenço da Serra). Em 14 de março de 1886, com as presenças do Casal Imperial, Dom Pedro II e Dna. Leopoldina, e a do Conselheiro João Alfredo, presidente da Província de São Paulo, foi inaugurada a nova estrada de ferro, com o trenzinho a vapor saindo da estação da Rua São Joaquim precisamente às 11 horas e 36 minutos da manhã.

A linha seguia pelas atuais Ruas Vergueiro e Domingos de Morais e pela Avenida Jabaquara, até o local onde hoje está a Igreja de São Judas Tadeu. Ali ficava a "estação do encontro", onde os trenzinhos faziam um reabastecimento de combustível e água. Seguia depois por vastos campos, onde hoje estão os bairros do Aeroporto e Campo Belo, e alcançavam o Brooklin Paulista. Ali havia curvas extremamente fechadas e o local era chamado de "Volta Redonda". Seguida depois pela atual Chácara Flora, e entrava em Santo Amaro por uma curva que passava pelas atuais ruas São José e Nove de Julho. O ponto final era na Praça Santa Cruz, onde hoje está a Escola Linneu Prestes. Este trenzinho ficou conhecido como o Trenzinho de Santo Amaro e o percurso todo era feito em uma hora e meia, mais ou menos.

A locomotiva do trenzinho à vapor

Em 1884, quando aquela linha férrea estava ainda em construção, o Presidente da Província de São Paulo enviou o seguinte relatório à Assembléia Provincial: "A linha de Carris de Ferro de São Paulo à vila de Santo Amaro, parte desta Capital, na Rua Liberdade, esquina da São Joaquim, e segue pela Estrada Vergueiro até o quilômetro 2; desse ponto se afasta a linha até à estaca 245, sendo dois quilômetros e 900 metros do ponto de partida, continuando daí por diante o traçado, ora aproximando-se ora afastando-se da estrada que conduz àquela vila. Quando completamente terminada a linha será de 15 quilômetros" (os grifos são nossos).

O médico milanês Dr. Afonso Lomônaco contou em livro as viagens que fez pelo Brasil, percorrendo o Rio de Janeiro, Minas Gerais e São Paulo, entre os anos de 1885 e 1887. Dentre os relatos que fez, eis o que disse sobre a sua viagem no trenzinho de Santo Amaro: "De Vila Mariana prolongava-se a estradazinha de Santo Amaro, por vinte quilômetros através de planície árida e despida, onde só quase havia vegetações rasteiras, desérticas, por assim dizer. Santo Amaro, humilde e risonho arraial de casinhas baixas, pintadas de cores vivas e quase todas da mesma altura, com poucas ruas largas de terra batida, e duas grandes praças, parecendo as aldeolas da Sicília. Vivia como que segregada do mundo, mas a abertura da linha de trens a vapor transformou o local em passeio muito em moda: nos dias festivos ali acorrem numerosas pessoas, desejosas de lhe respirar a belas auras, e de vagar pelos campos vizinhos do humilde vilarejo, digno de acatamento histórico...".

Em 1899, foi inaugurada a Santa Casa de Misericórdia de Santo Amaro

Em 7 de julho de 1913, a antiga linha de trens foi substituída por uma linha de bondes, que manteve o mesmo "ponto inicial" do antigo trenzinho.

Os primeiros bondes

A partir do seu ponto inicial, os bondes seguiam pela Avenida da Liberdade, Avenida Vergueiro, Rua Domingos de Morais, adentrava a Avenida Conselheiro Rodrigues Alves e seguia por esta avenida até o seu fim (mais ou menos onde hoje está o Instituto Biológico). Deste ponto em diante, os bondes seguiam em direção a Santo Amaro, por um caminho exclusivo, idêntico a uma linha de trem.

Hoje, este trecho exclusivo, que ia do fim da Av. Cons. Rodrigues Alves ao início da Av. Adolfo Pinheiro em Santo Amaro, corresponde às avenidas Ibirapuera e Vereador José Diniz.

Neste mesmo trecho exclusivo, a São Paulo Light and Power, empresa concessionária que implantou os bondes em substituição a antiga Estrada de Ferro São Paulo a Santo Amaro, adotou a nomenclatura dos pontos de parada, em ordem numérica: 1º. desvio; 2º. desvio, etc. (chamavam-se desvios pelo fato de existir somente uma linha e os bondes esperavam naqueles desvios, ou pontos de paradas, os bondes que vinham em sentido contrário).
Anos depois, a "Light" resolveu dar nomes àquelas "paradas" ou "desvios". Assim, foram escolhidos nomes de Presidentes da Republica (Deodoro, Floriano...) e outros nomes ilustres de políticos nacionais para denominá-las. Todavia, o 5º desvio foi uma exceção dentro deste critério adotado pela concessionária. A ele foi dado o nome de Brooklyn Paulista, em homenagem ao Bairro do Brooklin da Cidade de Nova York (USA), que era, na época, o maior e mais importante bairro daquela cidade.

A parada "Brooklin Paulista" (antigo 5º. Desvio)

Esta parada era no cruzamento da linha com a Rua Joaquim Nabuco. Ao terminarem, então, aquele trecho exclusivo, os bondes adentravam a mencionada Avenida Adolfo Pinheiro e, por ela, seguiam até o Largo 13 de Maio. Deste ponto, os bondes desciam pela Alameda Santo Amaro em direção ao Rio Pinheiros, ultrapassavam-no por uma ponte "também exclusiva" e chegavam ao Largo da Capela do Socorro, que era o "ponto final" daquela linha.

Mais moderno, este bonde ficou conhecido como: "Camarão". Em 1924, foi inaugurada a Igreja Matriz de Santo Amaro.

1932: Santo Amaro na Revolução Constitucionalista

A Revolução Constitucionalista de 32, ou Guerra Paulista, foi o movimento armado ocorrido no Brasil entre Julho e Outubro de 1932 visando: à derrubada do governo "provisório" de Getúlio Vargas e à instituição de um regime constitucional.
Tudo tem seu início após a Revolução de 1930, com a qual Getúlio Vargas assume o poder e coloca fim na supremacia política de "paulistas" e "mineiros", nomeia interventores para o governo de todos Estados, e designa Interventor em São Paulo o Cel. João Alberto de Barros, que foi considerado pelos paulistas como "forasteiro" e "plebeu".

Com esta designação, os paulistas passaram a considerar que São Paulo estava sendo tratado pelo Governo Federal como "uma terra conquistada", governada por  tenentes de outros estados. Isto aumentou, ainda mais, o sentimento que tinham de que: "a Revolução de 1930 fora feita contra São Paulo". Esta irritação das oligarquias paulistas com Vargas não cedeu sequer com a nomeação de um paulista, Pedro Manuel de Toledo, como interventor do Estado, e começaram a tramar um movimento armado visando a derrubada de Vargas, sob a bandeira da proclamação de uma nova Constituição.

No dia 23 de maio de 1932, são assassinados no centro da cidade de São Paulo, por partidários de Vargas, os jovens: Mário Martins de Almeida, Euclides Bueno Miragaia, Dráusio Marcondes de Sousa e Antonio Américo Camargo de Andrade. Este ato covarde, que foi a "gôta d'água" na revolta paulista, serviu de "estopim" para que, no dia 09 de julho de 1932, eclodisse o movimento revolucionário que, em homenagem àqueles jovens, ficou conhecido como MMDC (Martins, Miragaia, Dráusio, Camargo). Com ele, os paulistas passaram a exigir o fim da ditadura Vargas e a implantação de uma verdadeira democracia com a promulgação de uma nova Constituição!

Este movimento inicia-se, então, com os paulistas acreditando possuir o apoio de outros Estados, principalmente Minas Gerais, Rio Grande do Sul e Mato Grosso, com os quais havia firmado acordos de co-participação das respectivas Forças Militares (Força Pública e Exército) no movimento revolucionário.

Só que, no decorrer do movimento armado, apenas Mato Grosso cumpriu o acordo de apoio aos paulistas, com um forte contingente comandado pelo General Bertoldo Klinger, pois Minas Gerais e Rio Grande do Sul, logo no início do conflito, foram "compelidos" por Vargas e, assim, alem de não cumprirem o acordo de apoio preestabelecido, ainda se juntaram às tropas federais contra São Paulo.

Contando unicamente com o leal apoio do Estado do Mato Grosso, as tropas revolucionárias se viram lutando em três grandes frentes: o Sul Paulista, o Leste Paulista e o Vale do Paraíba.

A participação de Santo Amaro na Revolução

1932 era, também, o ano do primeiro centenário do Município de Santo Amaro. Sob a coordenação de uma comissão, previamente eleita, os santamarenses, orgulhosos de sua cidade, haviam organizado para aquele ano uma série de festividades alusivas ao evento, sendo que o seu ponto alto seria uma Missa Campal.

Eclode na Capital o Movimento MMDC e, no dia e hora programados, com a praça repleta de devotos santamarenses, estava aquela Missa em andamento, quando, por ocasião do ofertório, explodiram três morteiros, sendo que um deles "abriu-se no espaço" e "desfraldou uma linda bandeira paulista".

Aquela bandeira, pirotecnicamente desfraldada, deixou a multidão eletrizada pela lembrança do momento que São Paulo vivia.

Então, logo após terminar a missa, a comissão decide aderir àquele movimento e, poucos dias depois, junto com outros santamarenses, dirige-se a São Paulo onde são todos recebidos pelo então Coronel Euclydes de Oliveira Figueiredo (pai de João Batista de Oliveira Figueiredo, que mais tarde chegou à Presidência da República).

Nesta audiência, ao ver o entusiasmo daqueles destemidos santamarenses, o Cel. Euclides pergunta-lhes: "O que vocês querem?".

Em "resposta uníssona" ele ouve: "Queremos armas e munição". Emocionado, o coronel pensa apenas um instante e diz:

"Neste momento está organizada a Companhia Isolada do Exército de Santo Amaro".

Foi assim, desta forma, que a festa comemorativa do primeiro centenário do município de Santo Amaro foi substituída por um ato de bravura em favor de uma causa nobre!

A partir dai, um grande número de voluntários santamarenses (capelão, médicos, engenheiros, operários, funcionários públicos, etc.) alistam-se e juntam-se a Companhia Isolada do Exército de Santo Amaro.

Um voluntário santamarense

Tropa formada, sob o comando do tenente de exército Luiz Martins de Araújo e tendo no sub-comando Moupyr Monteiro, os bravos santamarenses iniciam sua jornada passando pela serra de Cubatão e a Praça de Santos, e seguem pelo litoral em direção à divisa do Paraná.

Esta era a Frente Sul Paulista onde, junto com outras tropas, a Companhia Isolada do Exército de Santo Amaro ficou posicionada (próximo a cidade de Itararé), acreditando e contando com o apoio que viria do Rio Grande do Sul.

No entanto, como já mencionado, o Rio Grande do Sul , "compelido por Vargas", não deu o apoio prometido. Assim, a cidade não pode ser defendida e as tropas paulistas foram obrigadas a se retirarem para o Rio Paranapanema. Por este grave erro logístico, abriu-se quase 150 quilômetros de território paulista para as tropas federais.

Na Frente Leste Paulista as tropas revolucionárias penetraram no sul de Minas Gerais, atingindo a Cidade de Pouso Alegre no fim de julho, começo de agosto. No entanto, foram repelidas pelas forças federais de volta a território paulista em direção de Campinas.

Nestas duas frentes, as tropas federais, em maior número e mais bem equipadas, ocuparam todas as cidades próximas e forçaram a rendição das tropas paulistas.

A Frente Vale do Paraíba, na divisa com o Rio de Janeiro, era vista pelos paulistas "como o teatro principal da guerra". Nesta frente, a estratégia prevista era: a conquista da cidade fluminense de Resende, e a subseqüente marcha em direção à cidade do Rio de Janeiro, com o apoio prometido das tropas mineiras.

No entanto, como o apoio de Minas Gerais não veio (também fora "compelida" por Vargas), as tropas paulistas demoraram a se mover em direção a Resende, e logo se viram defendendo o próprio território das tropas federais.

Nesta frente, os combates mais importantes se deram na região do Túnel da Serra da Mantiqueira, que divide São Paulo de Minas Gerais.

Soldados paulistas no Túnel da Mantiqueira

O terreno acidentado do Vale do Paraíba, e a existência de diversas cidades neste vale, levaram a um combate encarniçado entre as tropas. Porém a superioridade, de tropas e armamentos, das forças de Vargas logo levou à ocupação de diversas cidades paulistas do vale do Paraíba, como Lorena e Cruzeiro e o conseqüente recuo das tropas paulistas em direção à capital.

Foi precisamente "neste palco de guerra", já no início do mês de setembro, que aconteceram as maiores baixas entre os soldados paulistas.

Não contando com este combate encarniçado, é sabido que a maioria dos soldados paulistas, que ali foram feridos, somente suportou a dor graças às aplicações de morfina, e a grande e contínua ingestão de bebida alcoólica, quando a morfina acabou. Nestas condições, aqueles feridos que sobreviveram devem suas vidas unicamente à infinita bondade de Deus!

Por estar inserido, tanto na história de santamarenses quanto no movimento revolucionário, sinto-me na obrigação de relatar que: "entre os soldados paulistas que lutaram nesta frente" (Vale do Paraíba) estava Julio Simões, filho de Manuel Simões e Maria da Conceição Simões, que se alistou na Cidade de São Paulo (Capital) em virtude de estar "recém casado" com Zuleika Guilger Simões, filha de José Guilger Sobrinho (Juca Guilger) que, na época, juntamente com Izaias Branco de Araújo (Coronel Izaias) eram os mais influentes líderes comunitários e políticos do município e colocaram obstáculos em seu alistamento junto a Companhia Isolada do Exército de Santo Amaro.

Julio Simões

Foi na cidade de Queimada (próxima a Lavrinhas) que Julio Simões viu tombarem a seu lado muitos de seus companheiros (alguns deles, seus amigos desde a infância). Sem nada poder fazer quanto aos mortos e sem as mínimas condições de ajudar seus amigos feridos, ele ali permaneceu até que todos regressaram à cidade de São Paulo. Este pavoroso cenário de guerra deixou nele enormes seqüelas que o acompanharam durante grande parte de sua vida (Julio Simões é pai do autor deste modesto trabalho).

O fim da Revolução

Em 02 de outubro de 1932, na cidade de Cruzeiro, a liderança revolucionária paulista se rende para as forças federais chefiadas por Góis Monteiro.
Terminado o conflito, o ex-governador Pedro de Toledo, seu secretariado e outros políticos que tomaram parte ativa na revolução foram exilados e, até agosto de 1933, São Paulo foi ocupado militarmente.

Ao final, os paulistas computaram oficialmente 634 mortos (embora estimativas extra-oficiais falem em mais de mil mortos paulistas). Do lado federal nunca foram liberadas estimativas de mortos e feridos (como sempre acontece em todo governo ditatorial).

Entretanto, a "Derrota Militar Acachapante", transforma-se em "Majestosa Vitória Política", pois "Marcou o Início do Processo de Redemocratização do País".

Em 03 de maio de 1933 (cinco meses após o término da revolução) foram realizadas eleições para a Assembléia Nacional Constituinte, que culminou na promulgação, em 1934, de uma Nova Constituição. E mais! Naquelas eleições, graças à criação da Justiça Eleitoral, as fraudes deixaram de ser rotina nas eleições brasileiras, e nelas, também, a mulher votou pela primeira vez no Brasil em eleições nacionais.

Terminada a revolução, percebendo que seria difícil governar o País sem as oligarquias paulistas, Getúlio se reconcilia com São Paulo e, depois de várias negociações políticas, nomeia um "civil" e "paulista" para interventor em São Paulo: Armando de Salles Oliveira.

Mais tarde, ainda, Getúlio Vargas participou, pessoalmente, da inauguração da Avenida 9 de Julho, que recebeu este nome em homenagem à data em que se iniciou a revolução. A "Revolução de 1932" se transformou, assim, no "Símbolo Máximo do Estado de São Paulo" (como o é a Guerra dos Farrapos para os Gaúchos).

O reconhecimento aos Heróis

Anos mais tarde, por Decreto, a Assembléia Legislativa do Estado de São Paulo conferiu a cada um dos soldados paulistas, que lutaram pela redemocratização do País e por uma nova Constituição, o Título e a Medalha de: "Herói da Revolução Constitucionalista de 1932". (Julio Simões, ainda em vida, foi um dos que receberam este honroso título).

1934 - O aeroporto de Congonhas

Como o Campo de Marte era o único aeroporto que existia na Cidade de São Paulo e se localizava na sua zona central (por isto foi facilmente ocupado e tomado pelas tropas paulistas na revolução), Getúlio Vargas determinou ao Governo de São Paulo que procurasse um outro local para a construção de um novo campo de aviação no Estado.

Foi assim que, cumprindo aquela determinação, em 1934, dentro dos limites do município de Santo Amaro, era inaugurado o Aeroporto de Congonhas.
Embora nunca tenha sido admitido oficialmente, esta foi uma das razões preponderantes para a extinção do município de Santo Amaro, que adiante será relatada.

1934 - A criação dos distritos de Ibirapuéra e Parelheiros

Pelo Decreto nº. 6.518 de 1934, assinado pelo Interventor Federal em São Paulo, Armando de Salles Oliveira, em atendimento a pedido do então Prefeito de Santo Amaro, José Guilger Sobrinho (neto de Johannes Gilcher) foram criados no município de Santo Amaro os distritos de Paz de Ibirapuéra e Parelheiros. Pelo mesmo decreto, foram criados, também, os respectivos Cartórios de Registro Civil com Anexo de Notas, e nomeados como seus titulares Julio Simões e Juvenal Luz, respectivamente.

1935 - A extinção do Município de Santo Amaro

Pelo Decreto Estadual Número 5983, assinado pelo Interventor Federal em São Paulo, Armando de Salles Oliveira, o município de Santo Amaro foi extinto e incorporado ao município de São Paulo. Eis a íntegra do decreto Nº. 5.983 de 22 de fevereiro de 1935.

O Doutor Armando de Salles Oliveira, Interventor Federal no Estado de São Paulo usando das atribuições que lhe são conferidas pelo decreto federal nº. 19.398 de 11 de novembro de 1930,
Considerando que dentro do plano geral de urbanismo da cidade de São Paulo, o município de Santo Amaro está destinado a construir um dos seus mais atraentes centros de recreio;
Considerando que para a organização desse plano o Estado tem que auxiliar, diretamente ou por ato da Prefeitura, as finanças de Santo Amaro, tanto que desde já declara extinta sua responsabilidade para com o Tesouro do Estado, proveniente do contrato de 18 de julho de 1931, e que muito onera o seu orçamento e dificulta a sua expansão econômica e cultural;
Considerando que, liquidada essa dívida todas as suas rendas poderão ser aplicadas no seu próprio desenvolvimento;
Considerando ainda que o Estado não só se dispõe a incrementar em Santo Amaro, a construção de hotéis e estabelecimentos balneários que permitam o funcionamento de cassinos, com também já destinou verba para melhorar as estradas de rodagem que servem aquela localidade, facilitando-lhe todos os meios de comunicação, rápida e eficiente com o centro urbano;
Decreta:
Art. 1º - Fica extinto o município de Santo Amaro, cujo território passará a fazer parte do município da Capital, constituindo uma sub-prefeitura, diretamente subordinada à Prefeitura de São Paulo.
Art. 2º - O subprefeito será nomeado pelo Prefeito da Capital com os vencimentos anuais de 24:000$000 (vinte e quatro contos de réis);
Art. 3º - Serão mantidos os direitos dos atuais funcionários da Prefeitura de Santo Amaro, que poderão servir na sub-prefeitura ora, criada, ou ser reaproveitados na Prefeitura da Capital.
Art. 4º - Fica o Tesouro do Estado autorizado a cancelar o adiantamento de 500:000$000 (quinhentos contos de réis); atualmente acrescidos dos juros de 124:658$600 e que foi feito ao município de Santo Amaro em virtude do contrato de 18 de julho de 1931, abrindo-se para esse fim o necessário crédito.
Art. 5º - Este decreto entrará em vigor na data de sua publicação, revogadas as disposições em contrário.
Palácio do Governo do Estado de São Paulo, aos 22 de fevereiro de 1935,
ARMANDO DE SALLES OLIVEIRA
Valdomiro Silveira Francisco Machado de Campos.
Publicado na Secretaria de Estado dos Negócios da Justiça, em 23 de fevereiro de 1935.

Posteriormente, já incorporada ao município de São Paulo, a mesma área do antigo município foi subdividida nos subdistritos de: Santo Amaro; Ibirapuera; Capela do Socorro; e no distrito de: Parelheiros.

Muito do que foi dito até aqui está registrado em um mosaico que foi construído, em 1962, junto à Estátua do Bandeirante Borba Gato. Esta exótica obra do escultor santamarense, Julio Guerra, está situada na atual Avenida Santo Amaro e é ponto de referência não só da avenida quanto do bairro.

A estátua de Borba Gato

O bandeirante Manuel Borba Gato, que nasceu em Santo Amaro, ficou conhecido por acompanhar seu sogro, Fernão Dias Pais, em busca da "Terra de Esmeraldas", de 1673 a 1680. Apesar de não encontrar esmeraldas nesses sete anos, mas apenas turmalinas, Borba Gato prosseguiu sua expedição e acabou achando ouro. Por este fato, foi ele nomeado Guarda Mor do Distrito do Rio das Velhas.

Terminamos aqui este pequeno relato da história de Santo Amaro, na qual tentamos reproduzir a maioria dos fatos, acontecimentos e pessoas que elevaram o seu nome. Daqui a diante, então, como dissemos no início, passaremos a narrar "a incrível epopéia" pela qual passaram os "imigrantes alemães que vieram para Santo Amaro", desde que saíram de sua terra natal.

A epopéia dos Imigrantes Alemães

Em 1826, como falamos no princípio desta nossa narrativa, Dom Pedro I incumbiu Von Schaeffer de obter na Europa soldados que pudessem lutar nas guerras do sul e colonos que pudessem trabalhar na agricultura paulista.

O início da epopéia daqueles imigrantes, no Brasil, começa no dia 16 de dezembro de 1827 quando, depois de uma viagem de mais de seis meses desde Bremem e a bordo do navio Fliegender Adler, na qual muitos morreram, chegam ao Rio de Janeiro mais de quatro centenas de camponeses alemães (484) que são recolhidos na Armação.

Pouco antes disto, o Governo Imperial, prevendo a chegada de muitos colonos estrangeiros, antecipadamente e sem a menor consulta aos poderes que dirigiam a Província de São Paulo, havia remetido a ela o seguinte aviso:

"Sua Majestade o Imperador é servido que o Vice-Presidente da Província de São Paulo tome desde já as medidas que julgar convenientes para receber e alojar os colonos estrangeiros que em breve sairão desta Côrte para essa Província, e os mais que sucessivamente lhe serão enviados à medida que forem chegando".
Palácio do Rio de Janeiro, em 8 de novembro de 1827.
(a) Visconde de São Leopoldo".

Foi assim que 227 colonos alemães, que estavam entre os 484 estrangeiros que haviam chegado no Rio de Janeiro em 16 de dezembro de 1927, tempos depois desembarcavam em Santos-SP.

A chegada de imigrantes no Porto de Santos

Da Cidade de Santos, todos estes colonos foram levados a Cidade de São Paulo, e ali ficaram hospedados no "Hospital Militar", aguardando ordens sobre os seus destinos.

Para tanto, foi nomeado Diretor da Colônia o Dr. Justiniano de Melo Franco, que falava alemão, para representar os imigrantes, receber suas queixas e sugestões e pagar-lhes o subsídio determinado. Este subsídio, segundo ordens do Governo Central, seria de 160 réis para cada colono adulto e 80 réis para cada criança, e deveriam ser pagos até que eles se instalassem definitivamente.

Foi determinado, também, ao Dr. Justiniano de Melo Franco, que ele, junto com o Governo de São Paulo, deveria escolher um local para a instalação definitiva da colônia.
Ficou certo e estabelecido, ainda, que os colonos, depois de instalados: RECEBERIAM os títulos definitivos das respectivas datas de terras; TERIAM toda a assistência social (médicos e professores); e RECEBERIAM as ferramentas, sementes e os animais domésticos e de tração necessários (vacas e burros), que posteriormente seriam pagos por eles, em dinheiro ou em produtos de seus trabalhos.

Era uma determinação, também, que a Colônia devia instalar-se de modo a constituir centro de aproximação entre diversas localidades. Por isto, pensou-se em Juquiá, São Vicente, Itanhaem, Itapecerica, mas os alemães mostravam-se descontentes. Neste meio tempo, mais colonos foram chegando: 39 em 18 de janeiro de 1828, em 22 de maio outras 89 pessoas; em 27 de junho mais 175 e, em dezembro de 1828, chega uma grande leva de 257 imigrantes. Assim, ao todo, somaram 787 imigrantes que aqui chegaram desde dezembro de 1827.

O tempo passando, os problemas se avolumando e o Dr. Justiniano de Melo Franco, então, foi ver as terras devolutas em Santo Amaro, que ficavam há quatro léguas ao sul da freguesia. Do Ribeirão Vermelho até a Serra do Mar. ERA TUDO SERTÃO DEVOLUTO, mas, por ser um centro de aproximação entre cidades, este foi o local escolhido para ser uma das colônias, (sabe-se que, deste local, "por uma picada" chegava-se a Itanhaem e "pelo Rio Grande" chegava-se a Santos).

Parelheiros

Naquele local escolhido, havia um pequeno lugarejo conhecido como Santa Cruz, que era assim chamado porque nele existia uma cruz que ali foi colocada por um antigo morador devoto de nome Amaro de Pontes.

Como, mais tarde, este lugarejo foi palco de muitas corridas de cavalos (parelhas) entre os caipiras (antigos moradores) e os alemães (colonos), por este motivo, passou a ser conhecido como Parelheiros (hoje distrito de São Paulo-SP).

Obs: para manter aquela tradição, anos depois, o dono de um sítio nas proximidades do atual Largo de Parelheiros, o agricultor Karl Ablass fez uma pista para corridas de cavalos em um dos seus pastos.

Parelheiros se destaca, em relação à Colônia Alemã, pelo fato de haver uma estrada aberta no século XIX, por iniciativa de Henrique Schunck (alemão), pai do fundador de Cipó (hoje distrito de Embú-Guassu). A estrada de Parelheiros ligava as vilas de Embu-Guaçu e São José, de onde se podia partir para Rio Bonito e Santo Amaro, evitando, assim, a passagem pela Colônia, onde havia a antiga estrada da Conceição.

O Estabelecimento dos Alemães na Colônia

Dentre os 787 imigrantes alemães que estavam em São Paulo, 229 concordaram em ficar com as terras da colônia na freguesia de Santo Amaro. Desta forma, em 9 de junho de 1829, realizou-se a cerimônia do sorteio das terras entre as 94 famílias que manifestaram o desejo de estabelecerem-se naquele local.

Imagem de uma das Famílias no local escolhido

Estabeleceram-se, então, as referidas 94 famílias naquele local, que, por isto, passou a ser conhecido como "A colônia Alemã". Mas, infelizmente, a inexistência de uma política colonizadora bem orientada fez com que eles ali ficassem totalmente abandonados. sem médico para doenças ou partos, sem professor, sem intérprete, sem ferramentas, sementes e animais domésticos e de tração prometidos, e sem receberam nem mesmo os títulos definitivos das próprias datas de terras, que os tranqüilizariam quanto à posse legítima dos terrenos.

Juntando-se todas as promessas do Governo Imperial não cumpridas, à infertilidade das terras da colônia, entendem-se porque a dispersão dos colonos foi inevitável.
Por isto, dos primeiros 229 indivíduos que em 1829 ficaram naquela colônia, dez anos depois (1839) restavam apenas 157 pessoas e, já em 1847, estavam na colônia somente 09 famílias.

Foi assim, rapidíssima, a decadência de um empreendimento que, por ter sido mal planejado e executado pelo Governo Imperial, custou muito sangue, suor e sacrifício dos colonos alemães que ali foram jogados, muitos dos quais faleceram, vítimas de doenças tropicais.
E foi assim, também, que a Colônia Alemã de Santo Amaro, que deveria transformar-se em uma cidade, como idealizado e prometido, "definhou-se em tapera, com três ranchos pobres, ao redor de um cemitério". (Obs: Vide mais adiante parte da história da Colônia de Uvá - Goiás)

O Cemitério da Colônia

Data da época dos pioneiros imigrantes alemães o Cemitério da Colônia em Parelheiros. Sem qualquer amparo dos Poderes Central e Estadual, os colonos escolheram por conta própria um local para sepultar seus parentes que iam falecendo. Somente anos mais tarde, por iniciativa de José Guilger Sobrinho, que era Prefeito de Santo Amaro e outros descendente daqueles pioneiros, é que o local foi oficializado e devidamente demarcado. Este cemitério é hoje, praticamente, a única prova material do triste fim de um grande sonho.

Em 1966, a Prefeitura desativou o antigo cemitério, em virtude de seu estado de abandono. A medida, no entanto, desencadeou um movimento por parte da comunidade alemã de São Paulo, em prol da sua preservação e restauro. Graças a isto, ainda hoje as campas conservam o padrão construtivo do século XIX, com lápides de mármore e cabeceiras altas e, recentemente, a parte mais elevada do cemitério passou a ser usada para novos sepultamentos.

Em meados dos anos 1970, este cemitério, que é um dos mais antigos da cidade de São Paulo e marco da imigração alemã no Brasil, foi protegido por legislação de zoneamento, e, em 2004, foi incluído pela população como ZEPEC (Zona Especial de Preservação Cultural) no Plano Regional Estratégico das Subprefeituras.
Por estarmos narrando uma malsucedida empreitada do Governo Imperial do Brasil, iniciada com o desembarque em Santos dos primeiros colonos alemães "em 1927" e melancolicamente terminada em 1847, cabe aqui lembrar uma história semelhante, se não idêntica, de imigrantes alemães que, "em 1924", foram trazidos para Goiás, pelo Governo daquele Estado, que extraímos da edição de 06 de outubro de 2006 do Caderno DM Revista do Jornal Diário da Manhã, da Cidade de Goiânia, Estado de Goiás.

Vamos aqui reproduzi-la, em parte, da forma como foi impressa naquele jornal, esclarecendo que: todos os grifos nela colocados são nossos.

A Colônia alemã de Uvá em Goiás

Ursula Engel, hoje com 84 anos, é uma das pioneiras da imigração alemã para Goiás. Ela veio em 1924, com seus pais. Tinha pouco mais de um ano. Morou na Colônia de Uvá até os 20 anos. Hoje, reside em Goiânia.

Ursula Engel

Em Uvá - que hoje é um povoado do distrito da cidade de Goiás - ninguém sabe contar a história dos alemães. As casas construídas por eles foram derrubadas. "Não existe vestígio arquitetônico daquela época". Os descendentes dos alemães se casaram com goianos, mineiros, baianos e a cultura se perdeu.
Conta Ursula: "Vieram 120 famílias para Goiás e, no começo, os imigrantes sofreram demais. O governo goiano tinha programado espaço para 98, que ficaram em Uvá. As outras 22 famílias foram para Itapirapuã. Aos poucos, com as desistências, as famílias foram se reunindo somente na colônia de Uvá". Continuando sua narrativa, Ursula diz: "nada foi organizado pelo governo goiano para receber os alemães. Jogaram as famílias no meio da selva. Era só mato e pedra. Os estrangeiros tiveram que se adaptar aos costumes indígenas. Viviam de caça, pesca e frutos do mato. No início, a escola só tinha aula de alemão. Depois, o governo mandou professor de português". (Obs: - nem isto os colonos de Santo Amaro tiveram).
Guariroba, café, tábuas, porcos, galinhas, ovos e outros produtos eram trocados na cidade de Goiás - então Vila Boa - por açúcar, sal, farinha e arroz. "Naquele tempo, morria-se até de verminose". Muitas famílias voltaram para a Alemanha, quando Hittler chamou os alemães de volta à pátria. "Ainda bem que meu pai ficou por aqui", confessa Ursula, manuseando uma edição do livro Povo e Pátria, de 1939, que trouxe matéria sobre Uva e seus alemães.

Naquela matéria do Diário da Manhã consta também que a escritora Maria Helena de Oliveira Brito lançou em 1992, o livro A Colônia Alemã do Uvá (1924-1954), que traz sua tese de mestrado na área de História, na UFG. Ela diz que a Alemanha, após a 1ª Grande Guerra, entrou numa crise econômica, com desemprego e alta inflação. Com isso, as famílias procuraram o Brasil. A maioria delas veio para o sul do País. Como no sul as terras eram vendidas, muitas famílias vieram para Goiás, onde os lotes estavam sendo doados. O assentamento começou em 1924, durou 30 anos e se resumiu numa malsucedida iniciativa. "Eram aproximadamente 300 alemães que vieram para o sol inclemente dos sertões de Goiás". Algumas famílias foram para Uvá. Outra parte para as margens do Rio Itapirapuã. Com a enchente do rio, veio a epidemia da malária. Muitos morreram. A maioria perdeu tudo o que tinha. Começou então o caminho de volta. Nessa debandada, famílias vieram para Goiânia e Anápolis. Algumas foram para o Sul e outras voltaram para a Alemanha. "O sonho do eldorado tropical não deu certo".
Como pudemos ver nesta matéria do Jornal da Manhã aqui reproduzida, QUASE 100 ANOS DEPOIS, A MESMA HISTÓRIA SE REPETIU!
Promessas não cumpridas, desamparo, terra infértil, sofrimento, dor e até morte. O estabelecimento desses colonos alemães em Goiás em nada difere dos de Santo Amaro. Creio que a única explicação é que estes foram mais teimosos e, com esta inexplicável teimosia, conseguiram trazer enormes benefícios não só para Santo Amaro como também para toda São Paulo.

O progresso de Santo Amaro

Todos os alemães que vieram para a colônia de Santo Amaro eram humildes camponeses recrutados nas roças do interior da Alemanha, e vieram para o Brasil, única e exclusivamente, para dedicarem-se às atividades agrícolas. No entanto, muitos deles, vendo que o local a eles destacado não lhes oferecia qualquer perspectiva de futuro, deixaram a colônia improdutiva e estabeleceram-se no Centro da Freguesia de Santo Amaro e em sítios por eles adquiridos nas proximidades.

Assim, por conta própria e sem qualquer amparo governamental, buscaram, encontraram e compraram melhores terras e começaram a plantar e a colher mandioca, milho, feijão, arroz e batata inglesa. Este tipo de batata é, ainda hoje, uma cultura típica alemã. Nestas suas propriedades rurais dedicaram-se, também, à criação de gado e aves domésticas. Desta forma, estes colonos alemães aumentaram consideravelmente o volume de gêneros alimentícios produzidos na velha freguesia, fazendo com que, já em meados do século XIX, aquela região fosse considerada o celeiro da capital. Todos os gêneros de primeira necessidade os habitantes de São Paulo compravam dos agricultores alemães de Santo Amaro.

Da mesma forma, como naquela época qualquer atividade mecânica era rara e bem paga no Brasil, alguns daqueles colonos, que eram hábeis oficiais mecânicos, alfaiates, sapateiros, tanoeiros, serralheiros, marceneiros, torneiros e artesões, etc., com estas suas habilidades produziram grande número de artesanatos e utensílios pessoais e domésticos que, junto com madeira lavrada, feixe de mucuta, carvão e pedra de cantaria, levavam para vender na Feira do Bexiga (hoje Bela Vista) na Cidade de São Paulo.

Para fazer este transporte eles usavam tropas de burro e carro de boi, e este foi um dos motivos fundamentais para a idealização e construção da linha do Trenzinho à Vapor que passou a ligar São Paulo a Santo Amaro, e vice-versa.

Com o passar do tempo, eles e/ou seus sucessores abriram suas próprias lojas de comércio (oficinas artísticas e mecânicas, alfaiatarias, marcenarias, tornearias, serralherias, sapatarias etc.) e nelas passaram a vender tudo o que produziam.

E foi graças a esta força empreendedora dos colonos alemães que fez com que: "Santo Amaro terminasse o século XIX rico e independente"

Por si só, esta conquista basta para reconhecermos que Santo Amaro e São Paulo têm uma dívida eterna para com aqueles pioneiros colonos alemães. Por isto, aquelas famílias, seus nomes e suas histórias jamais poderão ser esquecidos.

As famílias dos Colonos Alemães

Faziam parte dos primeiros colonos a se estabeleceram na colônia as famílias: dos GILCHER, dos GOTTFRIED, dos KLEIN, dos HELPFSTEIN, dos ULRICH, dos HEILDRICH, dos SCHUNK, dos CONRADT, dos TEISEN, dos KASPER, dos KRIST, dos SCHIMIDT, dos ROSKENBACK, dos REIMBERG, dos SELLIG. "Porque estes nomes não chegaram até nós escritos desta forma". Certamente, o que contribuiu, de forma inequívoca, para a "deturpação da grafia daqueles nomes alemães" foram: "a falta de instrução daquelas famílias e a falta do intérprete e professores prometidos pelo Governo Imperial que nunca chegaram".

Para melhor explicar "o porque" da deturpação daqueles nomes, vou usar aqui minha experiência de mais de 50 anos de trabalho em Cartório de Registro Civil para dizer o que provavelmente ocorreu. Foi o seguinte: "Os primeiros colonos, após o nascimento de cada um de seus filhos, ao se dirigirem à Cúria, ou ao Cartório de Santo Amaro, para registrá-los, por não saberem escrever (analfabetos), pronunciavam seus nomes em alemão". Desta forma, o responsável pela Cúria, ou o Oficial do Cartório, sem entenderem a língua alemã, sem intérprete e sem quaisquer dados materiais (documentos ou cartas) que pudessem ajudá-los, transcreveram seus nomes para os respectivos termos de registros da forma como, possivelmente, deveriam ser eles escritos na língua portuguesa.

Tomemos como exemplo o nome "Gilcher": Se separarmos este nome em "silabas", teremos: Gi-l-cher. A primeira silaba Gi, pronunciada em alemão soa "Gui" (como Gui-lher-me, Gui-ma-rã-es, Gui-lho-ti-na, etc.). O l (éle) tem o som do "L" de SAL pronunciado corretamente pelos gaúchos. A segunda silaba (cher) em alemão soa "ker". Até aqui deu para entender que aquelas duas sílabas pronunciadas em alemão soariam: Gui - ker. Como tem o "L" no meio e dependendo de como estejam elas sendo pronunciadas, também pode soar "Guil-ker", Gui-lher" ou "Guil-ger". Por isto, o nome Gilcher primeiro virou Guilker, depois Guilher e, finalmente, consolidou-se como Guilger (pronunciado: Guiu-ger) como ficou conhecido até hoje.

Por estas explicações, fundadas em minha experiência, com toda a modéstia, posso afirmar que a culpa pelas deturpações não cabe nem aos colonos alemães e nem aos responsáveis pela Cúria ou pelo Cartório. Foram as circunstâncias!

Desta forma, pode-se dizer, então, que, por aquelas circunstâncias: os GILCHER viraram Guilker, depois Guilher e depois Guilger; os GOTTFRIED viraram Godtsfriedt, depois Godtsfriedz, depois Gottefried, e até Gotsfridz; os SCHUNK viraram Schunck; os KASPERS viraram Caspar e até Gaspar; muitos dos KLEIN viraram Clein e até Crem; os SELLIN viraram Zilling, os HELPFSTEIN viraram Helfstein, os ROSKENBACK viraram Rockenbach e até Rokumbach etc., etc.

Para comprovar as mudanças que, ao longo dos anos, vieram acontecendo com a grafia dos nomes daquelas famílias, abaixo reproduzimos duas partes uma planta datada de 1889, de um terreno ocupado, na época, pela viúva Klein Lexandrina.

Nesta primeira parte aqui reproduzida, que é o topo da planta, pode-se ver que o nome da família Klein ainda conservava a sua grafia original.

No entanto, nesta segunda parte, claramente se verá que o nome Gilcher (que hoje é Guilger) está escrito como Guilher, e o nome Gottfried, ali já estava escrito Gottefried.

E mais! Muitas destas famílias, inclusive, ficaram conhecidas apenas pelos apelidos, tais como: a Família do Pedro Sapateiro (Helpfstein); a Família do Henrique Magro (Reimberg); a Família do Zé da Venda (Schunk); a Família do Adão Garça (Reimberg); e outras no momento não recordadas.
Mas não foi só nos nomes que houve a deturpação de suas origens alemãs. O inevitável "acaboclamento" (constantes e sucessivos cruzamentos dos descendentes do velho núcleo da colônia com os caboclos) determinaram, também, uma nova geração com aparência física estranha à original: "Crianças altas e magras, de cabelos loiríssimos, com olhos azuis e pele morena".

E mais ainda! Com todas estas deturpações, seus descendentes esqueceram, também, a cultura alemã dos seus ancestrais, suas lendas, suas canções e seus trajes. Esqueceram, inclusive, seus pratos, como o eisbem, os cremes de leite, os choucrouts, mesmo porque, ainda na colônia, aqueles seus ancestrais, por muito tempo sem as mínimas condições, passaram a se alimentar de feijão, farinha, peixe e palmito que iam buscar no mato.

Por tudo isto é que: aos descendentes daqueles imigrantes muito pouco restou que os fizessem lembrar a alemanha! mas, por tudo o que aqueles colonos representaram em nossa história, aos seus descendentes restou: o enorme orgulho de deles descenderem!

Fontes

Jornais: A Tribuna de Santo Amaro, A Gazeta de Santo Amaro, O Estado de São Paulo, Folha de São Paulo e Diário da Manhã (Goiânia); Internet: Wikipédia - a enciclopédia livre; yahoo.com; Sampa Online (cetrasa.com; santoamaroonline.com; brooklinonline.com). Documentos: Pessoais; Núcleo de Documentos Especiais - Sala da Memória da Biblioteca Presidente Kennedy (hoje Biblioteca Prefeito Prestes Maia); dados do mosaico junto à Estátua do Bandeirante Borba Gato; e Cúria Metropolitana de São Paulo. Livros: "Histórias dos Bairros de São Paulo: Santo Amaro", de Maria Helena Petrillo Berardi; "A Colônia Alemã de Santo Amaro" de Edmundo Zenha; e texto de Míria de Moraes e Thiago Luz Bronzoni no Sampa Online. Depoimentos: De parentes e antigos moradores dos locais citados. Fotos: Os Direitos Autorais da maioria das fotos que ilustram este trabalho pertencem ao Portal Sampa Online e a DIM/DPH/SMC/PMSP. Colaboração: Roberto Guilger (também descendente daqueles imigrantes).

Autor

Julio Guilger Simões (julioguilger@yahoo.com.br)

Dados Pessoas
Nasceu no 30º subdistrito - Ibirapuéra - do Município e Comarca Capital do Estado de São Paulo, em 09 de novembro de 1938 e é filho de Julio Simões e Zuleika Guilger Simões. Residiu na Cidade de São Paulo até 23/12/1999, a partir de quando, juntamente com sua companheira Lídia da Silva Guilger Simões e o filho do casal, Bruno César Silva Guilger Simões, mudou-se para Catalão, GO, onde, atualmente residem

Escolaridade
Jardim da Infância: Colégio Beatíssima Virgem Maria (Brooklin); Curso Primário: Liceu Sagrado Coração de Jesus - São Paulo - Capital; Curso Ginasial: 1º e 2º anos: Colégio e Seminário São Manuel Lavrinhas - São Paulo; 3º e 4º anos: Escola Estadual Mario de Andrade (Brooklin); Curso Colegial: Colégio La Salle - Aparecida do Norte - São Paulo; Curso Superior: Faculdade de Direito do Sul de Minas - Pouso Alegre - Minas Gerais

Serviço Militar: Ano 1957 - II Exército; 6º. Regimento de Infantaria; 1ª. Companhia de Fuzileiros - Caçapava - São Paulo; // CARREIRA PROFISSIONAL: Cartório de Registro Civil e Tabelionato do 30º subdistrito - Ibirapuéra - São Paulo - SP, onde foi: Auxiliar (1952 à 1960); Escrevente Habilitado: (1960 à 1974); Oficial Maior (1974 à 1984); Titular: (1984 à 2000); Aposentou-se neste cargo em 2000

Cargos em Associações profissionais
Vice Presidente da Associação dos Serventuários de Justiça do Estado de São Paulo; 1º Secretário do Colégio Notarial do Brasil - Seção São Paulo; Presidente do Colégio Registral das Pessoas Naturais do Brasil; Presidente do Colégio Registral das Pessoas Naturais do Brasil - Secção São Paulo; Sócio Fundador da Associação dos Registradores das Pessoas Naturais do Brasil (ARPEN) e da sua Regional de São Paulo

Cargos Públicos
Assistente Técnico Administrativo da Secretaria de Esportes e Turismo do Estado de São Paulo de 1979 à 1983; Assistente Técnico Legislativo da Assembléia Legislativa do Estado de São Paulo de 1985 à 1986

Obras editada
Sob o comando dos respectivos Juizes Titulares da 2ª Vara de Registros Públicos da Comarca de São Paulo, e juntamente com outros líderes dos Oficiais de Registro Civil daquele Estado, participou e redigiu as duas primeiras edições do Livro "Orientação aos Oficiais de Registro Civil"

Vida cultural
Como ator de Televisão, foi o 2º a interpretar o personagem "Pedrinho" no programa infantil "Sitio do Pica Pau Amarelo" (de 1952 a 1954), na extinta TV Tupi de São Paulo (vide biografia em: www.museudatv.com.br).

Vida comunitária em Catalão - Goiás
Mudou-se para o Distrito de Pires Belo em 15 de junho de 2001 e, em 24 de janeiro de 2002, juntamente com mais 16 moradores, fundou a 1ª Associação de Moradores daquele Distrito. Na 1ª Diretoria eleita exerceu o cargo de Assessor da Presidência e, na segunda eleição, foi eleito Primeiro Secretário da Diretoria

Títulos recebidos
Em 2003, por seu prestígio e trabalho comunitário realizado no Distrito de Pires Belo - Catalão - Goiás, recebeu o "TÍTULO DE CIDADÃO CATALANO", outorgado pela Egrégia Câmara Municipal de Catalão, por decisão unânime, cuja iniciativa se deve ao Ilustre e Nobre Vereador, Doutor Armindo Martins Vaz.