Comunicação
por Elmo Francfort Ankerkrone
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A força da mídia em 1932
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Para a mídia brasileira, o ano de 1932 foi um dos seus grandes marcos. Foi quando tivemos novamente a certeza de que a mídia é o 4º poder. E colocamos este ano em nossa análise devido a grande Revolução Constitucionalista de São Paulo, quando os paulistas pegaram em armas e partiram ao ataque do restante do Brasil.

A imagem que o governo getulista passava para o resto do Brasil era a de que São Paulo queria se separar e que nós exigíamos leis que iriam prejudicar o restante do país e só nos beneficiar. É bom lembrar que a revolução aconteceu dois anos depois da de 30, onde os brasileiros brigavam contra a autoritária política café-com-leite, onde paulistas e mineiros tomavam conta do poder. Após isto, Getúlio Vargas assumiu o poder e tornou igualitária a força entre todos os Estados. Só que não foi por muito tempo assim. Getúlio via São Paulo como um Estado que humilhou todos os outros por tantos anos e queria agora a vingança, humilhando-os, querendo puni-lo com todas as leis possíveis e colocando um interventor não-paulista para administrar o Estado. Só que os paulistas não gostaram da brincadeira.

Em 23 de maio de 1932, os manifestantes paulistas resolvem se chocar contra os membros da Legião Revolucionária (transformada no Partido Popular Progressista, sob a liderança de Miguel Costa). Ali, bem em frente à Praça da República, são mortos 4 manifestantes: Martins, Miragaia, Dráusio e Camargo. Os estudantes que formaram a sigla "MMDC", o grande símbolo das campanhas revolucionárias dali para frente.

Só que sobre este fatídico episódio, poucos se lembram que aconteceu na mesma Praça da República, defronte ao número 17, onde se localizava na época a Rádio Record, de Paulo Machado de Carvalho. Deste esta hora a mídia radiofônica estava presente.

É bom lembrar que antes das manifestações aconteceram o primeiro passo destes estudantes foi a invasão dos estúdios da Rádio Record, chegando até a sala de Paulo Machado de Carvalho e ordenando que o mesmo colocasse no ar a leitura de um abaixo-assinado. A Rádio Record teve que aderir, querendo ou não, à causa. E assim foi dito no ar:

"- Nós, os abaixo-assinados, declaramos que invadimos, à valentona, os estúdios da PRB-9 Rádio Record de São Paulo, e conclamamos o povo para que se mude a situação política existente no Brasil."

Logo leram pela Record o nome de cada um dos que assinava o manifesto contra Getúlio Vargas.

Memorial em homenagem aos revolucionários constitucionalistas, na sede da Rádio Record em São Paulo. (1932) - Acervo Rádio Record.

Aos poucos os demais meios de comunicação foram se aproximando daqueles ensaios que culminariam em uma revolução. Bravo, um grande defensor de São Paulo, o jornalista Cásper Líbero se pôs a defender a causa. E foi assim que o jornal "A Gazeta" se tornou um dos grandes símbolos da revolução. Os demais jornais de São Paulo também ajudaram, só que "A Gazeta" supriu todas as expectativas. O "Diário de São Paulo" se pôs contra Getúlio também, tendo o paraibano Assis Chateaubriand fazendo críticas ferozes ao governo e chegou a ser preso pelo mesmo depois. Chatô, que antes estava ao lado de Vargas na Revolução de 30, começava ali ganhar um grande inimigo, que até sua morte não descansou em fazer críticas ao político. Não só pelos seus jornais, como pelas suas rádios e por sua televisão, a TV Tupi - a primeira da América Latina.

Fervorosamente a mídia radiofônica e jornalística de São Paulo se puseram a favor do movimento constitucionalista.

Em 9 de julho, a revolução que já havia sendo planejada desde abril de 1931, explodiu. O coronel Euclides Figueiredo e os generais Isidoro Dias Lopes e Bertoldo Klinger assumiram o comando dos revolucionários paulistas, vindos de toda parte do Estado.

Naquele mesmo dia, através da Marcha da Revolução Constitucionalista de 32 (que eram os acordes do dobrado Paris Belfort), fizeram com que César Ladeira eloqüentemente levasse ao ar mensagens patrióticas, que aclamavam o espírito paulista contra os getulistas. Guilherme de Almeida escreveu poesias para que César Ladeira declamasse, aumentando mais ainda a força dos revolucionários ouvintes da Rádio Record.Os rádios de São paulo tocavam o dia inteiro a marcha.

E o locutor João Neves de Fontoura se pronunciou dizendo:

- "O espetáculo de São Paulo em armas entusiasma mesmo os céticos'; há uma estranha beleza nesta metamorfose marcial. Um povo de trabalhadores despe a blusa e veste a farda..."

Minas Gerais, que havia dito estar do lado de São Paulo, acabou por trair nosso exército no final. Quebraram de vez a união amigável do café-com-leite. Quando os paulistas invadiram o território mineiro, eles cercaram nossos exércitos, concluindo uma emboscada. Foi uma grande traição...

Foi nesta época que a Rádio Record foi aclamada como "A Voz da Revolução". César Ladeira, Renato Macedo, Licínio Neves e Nicolau Tuma foram os grandes locutores que até nas madrugadas faziam a campanha constitucionalista pela Record. E a marcha da revolução tornou-se o seu prefixo musical, de abertura de suas transmissões. A falida PRB-6 Rádio Cruzeiro do Sul também se manifestou a favor dos revolucionários, mas não com a mesma força da Record.

E pela Revolução dois outros grandes meios de comunicação foram utilizados. Além do rádio, dos jornais e das correspondências... Falamos do rádio-amador e do telégrafo utilizados pelas tropas para se comunicarem com todas as cidades paulistas.

Outro ponto forte da comunicação foi o da publicidade, que exerceu um papel muito importante. Desde os folhetos, com o slogan "MMDC - São Paulo pega em armas", até a divulgação dos postos de arrecadação de ouro e metal, para a confecção de armamento, roupas e capacetes para nossos soldados.

No final das contas, em 1º de outubro de 1932, as tropas brasileiras ganharam dos paulistas. Só que como o mundo em revolta se baseia em letras e armas: nas armas perdemos, mas nas letras ganhamos. Porque em 1932, Getúlio acabou por aceitar as normas paulistas para modificar a Constituição Nacional. Foi uma batalha que ganhamos pela metade.

César Ladeira foi preso por 16 dias e voltou para Record logo em seguida, em 1933 se transferiu para a Rádio Mayrink Veiga no Rio de Janeiro, onde se tornou, em pouco tempo, diretor geral da emissora.

Lembranças da revolução

A família Moreira de Freitas permanecia em paz, em seu casarão na Rua Augusta com a Avenida Paulista. Só que certo dia Otto (meu tio-avô Otascílio) entrou em casa dizendo que havia se alistado nas tropas que iriam para a revolução. Logo seguiu para as estradas de São Paulo.

Desesperado, com a saída do irmão caçula para guerra, meu tio-avô Elmo (o primeiro da família - do qual recebi o nome em sua homenagem - e ele que na verdade se chamava Ermenegildo), foi rapidamente se alistar para cair na mesma tropa que Otto. Só que Elmo não esperava pelo que o destino havia lhe preparado: ele caiu em tropa separada do irmão. O noivo de minha avó Adelia conseguiu notícias de Otto e fez com que o mesmo se tornasse enfermeiro dos constitucionalista, para que ele saisse do pelotão de frente. Tempos depois Elmo e Otto conseguiram voltar salvos para São Paulo.

Minha bisavó Alzira Esmênia Moreira de Freitas e seu esposo Antonio, que era português, sem esquecer do resto da família doaram suas jóias para a alimentar o exército de São Paulo com suprimentos e armamentos. O anel de casamento do casal, de ouro maciço, foi doado para as tropas e foi trocado por um de alumínio, onde internamente estava escrito: "Dei ouro pelo bem de São Paulo".

Enquanto dois dos seus cinco filhos estavam na guerra, Alzira passava muitas vezes mal, já que tinha pressão alta e diabete...Foi um alívio, em todos os sentidos, a chegada dos dois novamente em casa.

Minha vó Adelia passeava pelas ruas de São Paulo com o famoso quepe "Bibi", que nada tem a ver com o nome do bairro Itaim Bibi. Todas as mulheres faziam isto. O Estado estava coberto de "Bibis" pelas ruas. A bandeira do Estado foi trocada: ao invés do popular mapa azul do Brasil, colocaram o brasão de São Paulo. E todas as casas possuíam uma.

Na Capital Federal (Rio de Janeiro) estava a família Francfort. Meu avô Julio serviu de vigia do batalhão, fazendo por todas as noites o mesmo caminho para ver se algo estava fora do normal. Lá estava mais calmo o ambiente, do que nas ruas de São Paulo. E para chegar até onde ele estava, as tropas paulistas teriam que enfrentar batalhões inteiros da divisa do Estado.

Lembram-se dos aviões do exército da Capital Federal, os "vermelhinhos", que invadiram os céus de São Paulo. Falam das "balas dum-dum", que tinha um duplo disparo: na primeira acertavam o peito, na segunda, dentro do corpo davam um segundo estouro, provocando um rombo maior no corpo do inimigo.

Mas a guerra um dia acabou, naquele mesmo ano de 32. Os jovens das famílias Francfort e Freitas já podiam voltar a se verem, pois antes da revolução já se conheciam. E dois anos depois, em 24 de maio de 1934 as duas famílias finalmente se uniriam, com o casamento de Adelia de Freitas e Julio Francfort. Foram deixadas de lado as rixas e as famílias finalmente viveram em paz.

E em 1942, quando o Brasil entrou na 2ª Guerra Mundial todo o país estava novamente unido contra um inimigo ainda maior e que, não se tratava de um "irmão".

Encerramos esta coluna homenageando todos os que na Revolução Constitucionalista de 1932 morreram. E dedico também à memória de todos meus entes queridos, citados acima, que infelizmente não podem nos detalhar melhor este episódio de nossa história.

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