Quem é a TV Globo?

Televisão
por Elmo Francfort Ankerkrone
Setembro 21, 2001
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Quem é a TV Globo?

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Nesta semana falaremos sobre o surgimento da ZYD-81 TV Globo e o princípio de seu crescimento. Contaremos aqui sobre a chegada da emissora à São Paulo e toda sua transformação em sistema de rede. Apresentamos aqui uma Globo pré-fase Hans Donner. Eis os primeiros anos da Rede Globo. Plim-plim!

Antecedentes

Antes de falar do surgimento da emissora, é importante contar como tudo começou. Muita gente se esquece de que a TV Globo foi fruto das "Organizações Globo", que reunia rádio e jornais sobre a propriedade da família Marinho, sendo o sócio majoritário o empresário e jornalista Roberto Marinho. Mas para se falar de família Marinho temos que lembrar de Irineu Marinho.

Irineu Marinho começou inicialmente criou com seu colega Otávio Kelly no colégio um jornal manuscrito, depois o contrataram como revisor do Jornal "Diário de Notícias" em 1891, no Rio de Janeiro. Aos poucos ele ia crescendo no meio, passando pela "A Notícia", "Gazeta da Tarde", "A Tribuna" e "A Gazeta de Notícias" - desde repórter policial até diretor do jornal. Foi quando, depois de uma extensa carreira criou o vespertino "A Noite" em 1911 que deu ao jornalista sucesso garantido. "A Noite" foi responsável por apoiar o teatro, o cinema e a crescente aviação civil brasileira. Em 29 de julho de 1925 Irineu provou que "A Noite" era o início de um império, quando fundou "O Globo". Mas mal viu o crescimento do seu jornal, pois 23 dias depois ele morreria (com apenas 49 anos), deixando aos filhos seus dois jornais. A partir daquele 21 de agosto os filhos começaria a construir junto aos jornais a Empresa Jornalística Brasileira e a Rio Gráfica Editora (futura Editora Globo).

Como sócio majoritário dos irmãos Marinho, Roberto tornou-se chefe do jornal "O Globo" apenas em 1931. Em 1944 deu mais um grande passo: inaugurou a Rádio Globo. E assim as empresas começavam a compor as "Organizações Globo". E treze anos depois, 1957, as Organizações Globo conseguiriam a concessão do canal 4 do Rio de Janeiro. Roberto Marinho já não pensava pequeno...

Em 1962 as Organizações Globo já se armavam para chegada de sua televisão. Conseguiu uma parceria com o grupo norte-americano Time-Life, que investiu alto na emissora, mesmo que tenha sido de forma ilegal. Esta parceria não agradava nem um pouco as outras emissoras brasileiras, principalmente os "Associados", donos da Rede Tupi - a líder de audiência da época. Os Associados chegaram a processar a Globo e abrir uma CPI por causa da Time-Life...O acordo entre a Globo e esta empresa durou até 1969. A Time-Life foi embora, mas já havia investido tudo que a Globo necessitava para ser grande.

Raízes globais

Em cima do campo do Carioca Futebol Clube ergueram uma enorme sede para a TV Globo. Ali na Rua Von Martius, 22, no bairro do Jardim Botânico. Em 1964 foi feita uma grande festa apresentando aos contratados da Globo as instalações da emissora.

Em 24 de abril fizeram uma transmissão em circuito fechado com uma festa de inauguração, tendo presentes Roberto Marinho, os profissionais da emissora, o cardeal Jaime de Barros Câmara e o político Carlos Lacerda (governador do Rio de Janeiro). No dia seguinte fizeram mais uma transmissão em circuito fechado que não deu muito certo, cheia de problemas, mas os resolveram certificando que em tudo a Globo estava preparada. E assim, às 11h do dia 26 de abril de 1965 entrava no ar a ZYD-81 TV Globo, canal 4 do Rio de Janeiro. Entrou já com programação normal... A música que a inaugurou foi "Moon River", de Henry Mancini.

E a visão de Roberto Marinho era a de criar uma emissora diferenciada e grandiosa. Mesmo que não parecesse, já que nos seus primeiros anos ela era basicamente uma emissora popular. Mas aos poucos ela foi contratando os melhores profissionais do mercado, os que davam maior audiência. Raul Longras, Dercy Gonçalves, Chico Anysio, Chacrinha... Além de diretores com Walter Clark e Boni. Podemos dizer que a força global aumentou devido dois fatores do meio televisivo: a decadência da TV Rio após a contratação de quase todos os seus profissionais (exceto três) pela Rede Excelsior e depois a falência desta rede (principalmente a TV Excelsior do Rio de Janeiro, canal 2). Sem esquecer que a falência da carioca TV Continental e da crise que a Record e a Tupi começaram a sofrer no meio da década de 60, contribuíram também para a ascensão do império da Rede Globo. Exemplo disso é a dupla de sucesso Clark & Boni, como já dissemos. Walter Clark era da TV Rio e Boni da TV Excelsior, sendo que na época que foi contratado pela Globo ele já havia saído da Excelsior e fazia parte da direção da TV Tupi - Rio.

TV Globo Paulista

O início da formação da Rede Globo se deu a partir da compra de outras emissoras do país pelas Organizações Globo. A primeira foi a compra da TV Paulista (canal 5 de São Paulo, da O.V.C. - Organizações Victor Costa) em 1966, depois a compra de mais uma televisão em 1968, em Belo Horizonte - antiga propriedade do Grupo Jão Batista do Amaral - Emissoras Unidas) e depois em 1971 coloca para funcionar a concessão do canal de TV ganho pelos Marinho em 1962; e a última foi a de Recife (também da O.V.C) em 1972 - ano que chegaram as cores na TV brasileira.

Em pouco tempo, entrava no ar em São Paulo, através do Canal 5 (antiga TV Paulista, adquirida do grupo Victor Costa); em Belo Horizonte (pela emissora adquirida do grupo J. B. Amaral em 1968), em Brasília, em 1971 (concessão feita pelo presidente João Goulart em 1962), e em Recife (canal 13, emissora adquirida do grupo Victor Costa), no ano seguinte.

Podemos dizer que a compra da TV Paulista e a dizimação das Organizações Victor Costa colaborou e muito para o crescimento desta rede, mesmo que a Paulista estivesse sendo a segunda menor audiência de São Paulo. Ela não tinha mais programas como "A Praça da Alegria" e "Bate-papo com Silveira Sampaio" (ambos foram para a TV Record), mas tinha bons técnicos, boas instalações e acima de tudo um grande trunfo: o "Programa Silvio Santos", um programa que aos poucos ia crescendo, mas que desde aquela década de 60 já roubava os domingos das outras emissoras. Foi uma parceria grandiosa, tanto para a Globo, como para o Silvio. O programa dele chegou ao restante do Brasil a partir de 1969, mas ele começou em 1966 na TV Paulista mesmo.

A estratégia da Globo foi trocar o nome do canal aos poucos, para que o público se habituasse e deixasse de lado o já conhecido "TV Paulista". Assim, sob a coordenação do diretor da emissora paulista Geraldo Casé (pai da Regina Casé), foi feita uma boa campanha alterando o nome do canal de TV Paulista para TV Globo Paulista e depois TV Globo, gradativamente. Sabiam que na época a recusa de alguns paulistanos por uma emissora carioca poderia afetar o sucesso da mesma, mas aos poucos esse conceito foi se desfazendo no ar (o Rio de Janeiro já havia passado pela experiência de abrigar emissoras de São Paulo entre as cariocas, como o caso da Excelsior, já São Paulo não). Era frizado na época bem o número do canal e depois o globinho em seu canto. Um globo que não era aquele que hoje conhecemos, mas sim um globo redondo com Linha do Equador e dois meridianos.

Estas diferenças de nome, de modelo de programação não se deu aqui em casa apenas com a mudança da programação, mas também por causa dos nossos amigos que trabalhavam na emissora na época, como o David Grimberg e o Claudinei Fulmman, e que começavam a adotar já o nome de TV Globo. Até hoje quando meus pais e tios se referem a Globo da época não sabem definir se era ainda Paulista ou era Globo, pois a mudança foi feita com tanta cautela que aos poucos os paulistanos acabaram por adotar o nome.

Este globo era criação do desenhista Borjalo e foi o primo globo a fazer "plim-plim" em 1973, sendo que na verdade ele era um "bip-bip" de 3 segundos e que só depois, com Hans Donner ganhou aquele som de vidro tilintando e tornando-se o "plim-plim" atual. Na mesma época que se mudou o som, Hans Donner criou o novo logotipo da emissora e que a partir deste derivaram todos os seguintes.

Campeões de audiência

E dois fatos sociais foram importantes também para a implantação do padrão globo de qualidade nas principais "praças" do meio no Brasil (São Paulo - Rio de Janeiro).

- O primeiro fato: em 1966, ela conquistou o povo do Rio de Janeiro ao fazer a cobertura completa de uma avassaladora enchente que se abateu pela cidade. A idéia partiu de Walter Clark que ao ver aquela chuva forte caindo pela janela de seu escritório na Globo (no Jardim Botânico) disse para os câmeras mostrarem cenas de como estava o tempo. De repente começou a chover mais forte, cada vez mais, e a cobertura não podia parar. O povo carioca estava atento à cobertura, que depois esta chegou a ajudar o povo a arrecadar fundos de apoio às famílias desalojadas pela chuva.

- O segundo fato: em São Paulo, foi em 1969 quando o seu prédio da Rua das Palmeiras (que pertencia anteriormente à TV Paulista) pegou fogo... O povo se comoveu com o fato, pois ao contrário da Record, da Bandeirantes e da Excelsior, que tiveram incêndios na mesma época, a Globo teve perda total. E enquanto ocorria o incêndio, eles gravaram tudo que acontecia do lado de fora, enquanto era interditada a Rua das Palmeiras... Via-se as caras de profissionais desesperados em busca de salvar tudo que pudessem lá de dentro. Nesta época a Globo já passava pela fase de trânsito de TV Paulista para TV Globo Paulista. Isto foi o estopim para mudarem de vez o nome da emissora e centralizarem toda produção no Rio de Janeiro, ficando aqui só algumas coisas (como o jornalismo) na Praça Marechal Deodoro. Assim, através do Rio de Janeiro, criaram a primeira grande "cabeça de rede" que moldaria o estilo de rede de televisão nacional. Muitos dizem que este incêndio foi intencional, já que o dinheiro ganho com o seguro do prédio e dos equipamentos favoreceu a Globo e além disso, centralizaram a produção - barateando os gastos da rede.

E a partir daí a programação requintada, os profissionais "líderes de audiência" e sua dramaturgia ajudaram a se consolidar como a favorita do povo. Assim começamos a ver nesta coluna como a televisão se tornou a que hoje conhecemos.

A Globo além de ser "líder em audiência" também teve seus pioneirismos: foi a primeira emissora do país a nascer no país já com o VT (video-tape), foi a primeira a trasmitir ao vivo uma Copa do Mundo (Inglaterra, 1966), foi a primeira que via satélite transmitiu o lançamento da nave espacial Apollo IX (1968), foi a primeira que em sistema de rede oficial, que simultaneamente exibiu sua programação, fase iniciada em 1º de outubro de 1969 com a primeira edição do Jornal Nacional (o primeiro telejornal em rede nacional) e a estréia de uma programação totalmente nacional em 1975 e a utilização do satélite Intelsat para transmissões em tempo real em território nacional.

Novela à Magadan

No início a TV Globo do Rio de Janeiro não tinha grandes produções de teledramaturgia como tem hoje em dia. Ela no início perdeu muitos pontos para as cariocas TV Excelsior, TV Tupi e TV Rio. Como era nova não tinha nem a história, nem a bagagem das outras. Mas fazia questão de também ser ousada. Exemplo disso foi uma de suas primeiras novelas, "O Sheik de Agadir" de 1966, que explorou bastante as cenas externas da novela, com muita agilidade... Não foi gravada árabia saudita (nem em Marrocos, como "O Clone" que logo estreiará...), mas teve cenas com direito a areia, vento, praia e tudo mais... Ao invés de camelos, eram apenas cavalos andando no "deserto" da Praia de Copacabana e Ipanema. Acreditam?

A história era da cubana Glória Magadan, que foi a autora de todas as primeiras novelas da Globo, com ares de capa e espada. A mesma anos depois foi ultrapassada pela sua "discípula" Janete Clair, que fez com que suas novelas tivessem mais sucesso. Logo Magadan foi demitida da Globo e Janete Clair conquistou a posição em importância que a cubana possuía. Janete também teve que dar uma mãozinha no caso da novela "Anastácia, a Mulher Sem Destino" (1967) - onde estreou na Globo - que para diminuir os gastos desta história de Emiliano Queiroz ela provou um terremoto matando mais da metade do elenco da novela...

Antes do "Sheik", a Globo produziu "Eu Compro Essa Mulher" que não obteve sucesso e que também era de Glória Magadan.

A novela contava com a participação de Henrique Martins sendo o Sheik de Agadir. E seu par romântico foi Yoná Magalhães. Henrique Martins depois de atuar em diversas novelas resolveu se ausentar da profissão de ator e se dedicou à direção de diversas novelas. As mais atuais são "Roda da Vida" (Rede Record) e a atual "Pícara Sonhadora" (SBT), assim como "Éramos Seis" (SBT) e outras novelas do SBT, da Manchete, da Globo, entre outras.

Outras produções na mesma linha acabariam por convencer a Rede Globo de que a fórmula da telenovela precisava ser revista. As aventuras distantes, vividas por heróis lendários, deveriam ser substituídas por temas e personagens mais próximos da realidade brasileira.

Com a falência da Excelsior novos autores chegaram à emissora e muitos vieram da rádio também, como Dias Gomes, outros das demais emissoras (Lauro César Muniz veio da Record). Aos poucos a novela global começou a se tornar o padrão de dramaturgia no Brasil e no mundo.Consolidado o prestígio nacional e internacional das telenovelas, a Rede Globo partiu para a criação de séries. Sucessos de crítica e audiência, as séries brasileiras levaram a Globo a um novo desafio: as minisséries, que nasceram da necessidade de se contar uma história que não poderia ser alongada em muitos capítulos, nem reduzida a apenas um, sem perda de qualidade.

Falando agora da programação em geral, a Globo é hoje a maior produtora do mundo de programas próprios gravados. Conforme a própria Globo diz: "são 4.420 horas anuais, algo em torno de 2.210 longas-metragens". E além disso ela hoje tem dublado em diversos idiomas seus programas, sendo 130 países diferentes em todos os continentes assistindo suas produções. A Globo já chegou a ser a 4ª maior emissora comercial de televisão do mundo em produção, renda e tamanho.

Mesmo com todas essas mudanças, fica claro que não dá para se comparar a mesma Globo daquela época com a de hoje. Muita gente ainda culpa a Globo pelo envolvimento com os militares, mas fica claro nesse artigo que ela não está isenta desta culpa, mas que este peso foi de uma "outra emissora".

TV Leitor

- A coluna é dedicada hoje aos leitores Eduardo Furtado e Giancarlo Conti, que desde cedo vem acompanhando esta emissora e que hoje são profissionais da Globo. Ambos com um ideal em comum: trabalhar por amor a esta profissão e ao canal de que fazem parte.

- Meus parabéns a todos os radialistas de TV, pioneiros e futuros, que neste última dia 18 de setembro comemoraram o "Dia Nacional da TV" - agora como data oficial no país (conforme o decreto-lei 10.255 assinado por Fernando Henrique Cardoso), graças ao esforço da Pró-TV / APPITE (Associação dos Profissionais Pioneiros e Incentivadores da Televisão Brasileira). E ao mesmo tempo lembremos da memória da TV Tupi, nosso primeiro canal 4 (e 3 também) que foi a primeira emissora da América Latina, inaugurada há 51 anos atrás (18 de setembro de 1950).

- Ah! Uma idéia para os amantes da televisão: a mesmo Pró-TV / APPITE já está promovendo a Exposição "Janela Iluminada" no Conjunto Nacional (Avenida Paulista x Rua Augusta). Vale a pena dar uma chegada lá! Prestigie o trabalho dos pioneiros, que nunca devem ser esquecidos por nós. Compareçam na exposição!

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Imagens

Primeiro logotipo da Rede Globo (1965-1973). Criação: Borjalo. CEDOC / Rede Globo - Divulgação.

Cena da novela "Sheik de Agadir" (TV Globo, 1966) de Glória Magadan. Henrique Martins (de turbante), Amílton Fernandes e Yoná Magalhães. CEDOC / Rede Globo - Divulgação.

Primeira sede da TV Globo, canal 4 do Rio de Janeiro - Rua Von Martius, 22 - Jardim Botânico (1965) - CEDOC / Rede Globo - Divulgação.

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